quinta-feira, 19 de abril de 2007

Ficha de leitura: Introdução

WÖLFFLIN, Heinrich. “Introdução”. In: Conceitos Fundamentais de História da Arte (trad. João Azenha Junior). São Paulo: Martins Fontes (1996): pp. 1, 24.

Índice: 1. A dupla origem do estilo; 2. As formas mais gerais da representação; 3. Imitação e decoração.

Conteúdo: A dupla origem do estilo: o autor reporta-se a uma narrativa do pintor romântico Ludwig Richter (1803/1884), na qual ele se reporta a um experimento da juventude, em que o artista e três outros colegas pintores tentaram representar temas da natureza, de maneira a mais fiel possível, não resultando, entretanto, em qualquer duas imagens que se assemelhassem entre si; a narrativa parece ilustrar a dramaticidade da questão do estilo (sobretudo aquele que se manifesta enquanto traço individual do temperamento do artista), como um aspecto através do qual a representação visual de quaisquer temas parece estar sempre confrontada. O problema não se coloca como novidade para os historiadores da arte e, segundo o autor, são definidores do que é próprio a um artista (por comparação a outro), mesmo quando ambos estão inscritos em uma mesma tradição histórica ou nacional: as diferenças entre Sandro Botticelli (1445/1510) e Lorenzo di Credi (1458/1537) são notáveis, ainda que ambos sejam florentinos e contemporâneos; a representação do corpo, nos dois autores, se diferencia, pelo modo como, no primeiro, as formas humanas são infundidas de um sentido de animação que se opõe claramente ao repouso sob o qual o segundo vislumbra seus temas. Nada mais elucidativo do que comparar a curvatura do braço em um e em outro caso. Cotovelo pontiagudo, o traço acentuado do antebraço, a forma irradiante com que os dedos se abrem sobre o peito, cada linha carregada de energia: isto é Botticelli. O efeito suscitado pela obra de Credi é muito mais estático. Modelada de forma bastante convincente, ou seja, concebida em volumes, a forma de Credi ainda não possui a impetuosidade dos contornos de Botticelli (pp. 1,2,3). Voltando-se à representação de aspectos de objetos (como os pregueados de tecidos), o autor observa como esse tipo de tratamento diferenciado da matéria visual oferece elementos ricos para um estudioso das formas da representação visual: tomando em questão dois casos da pintura holandesa do século XVII, Gerard Terborch (1617/1681) e Gabriel Metsu (1629/1667), o autor nota como algo de semelhante com o caso dos florentinos se dá igualmente aqui; no primeiro deles, o tratamento da forma pela qual a textura será representada valoriza os aspectos de leveza e de caimento do tecido, ao passo que, no último caso, tudo tende ao repouso e à fixidez. Em nenhum desses casos, deve-se supor que a presença de movimento em uns e não em outros estabeleça uma diferença de valor entre os estilos, mas apenas uma distinção no modo pelo qual os indivíduos sentem o tema que se-lhes propõe. Do mesmo modo, o problema se manifesta na percepção dos aspectos que nos auxiliam a determinar as diferenças entre os tratamentos do paisagismo pictórico em Meindert Hobbema (1638/1709) e Salomon van Ruysdael (1600/1670), que, do mesmo modo que os dois anteriores, também estão inscritos às mesmas tradições histórico-geográficas, mas manifestam maneiras completamente distintas de se aproximarem das formas da representação das paisagens na pintura (pp. 5,6,7,8). Para além dos aspectos que servem para caracterizar os traços do estilo como definidores da individualidade artística dos pintores, o autor pede que se considerem igualmente outros parâmetros de comparação, definidos como fatores assimilação mais extensos: neste ponto, entram em questão as características de grupo, escola e de nacionalidade, associadas ao problema do estilo, e o autor se propõe a enfrentá-las, agora a partir do que é comum a muitos desses mesmos pintores tratados até aqui. Tratando da diferença entre a arte holandesa e a arte flamenga, o autor observa como é que a placidez das pastagens holandesas, em Hobbema é substituída pela dinamicidade, própria ao estilo de Rubens, por exemplo (neste caso, a diferença é tratada aqui como questão ligada aos aspectos geográficos ou nacionais, da expressão do estilo): assim sendo, é um aspecto definidor da arte holandesa a valorização do contorno, ainda que sutil (não se trata de uma expressão da arte linear), por oposição à força das massas e dos volumes, na arte flamenga, como um todo (aspecto esse que se manifesta não apenas no tratamento dos objetos, mas na própria composição do quadro, como no caso da pouca valorização do horizonte, em Rubens, por oposição à arte paisagista holandesa). Mais uma vez, no mesmo modo com o qual o estilo individual é caracterizado como um aspecto ligado aos diferentes modos de se sentir os motivos visuais, também no caso do estilo nacional, pode-se determinar que as características geográficas de uma arte são contaminações de uma maneira pela qual os afetos são organizados em suas várias manifestações e com repercussões, no caso, inclusive em campos como o da arquitetura, como destaca o autor. Deparamo-nos aqui em todos os pontos, com as bases do sentimento nacional, onde o gosto formal entra em contato direto com elementos espirituais e morais, e a história da arte terá diante de si gratas tarefas, tão logo passe a abordar sistematicamente a questão da psicologia nacional da forma. Tudo se relaciona. As posturas tranqüilas dos quadros de figuras holandesas também formam as bases para os objetos do mundo arquitetônico (pp. 9,10). Outro aspecto da manifestação mais extensa do estilo, diz respeito à variação dos aspectos definidores dos grupos de assimilação, no eixo do tempo: nesse sentido, o aspecto geográfico que define o estilo como um traço nacional (“da raça”, diz o autor) não se manifesta do mesmo modo, em todos os tempos em que vigora, nestes termos; no caso de Rubens, por exemplo, a manifestação de seu estilo mais individual (por oposição à arte holandesa, como um todo) conota esse aspecto da manifestação do estilo, na sua dimensão propriamente temporal. Neste ponto, o autor começa a insinuar alguns dos problemas centrais de sua obra, tendo em vista a variedade material com a qual a dimensão temporal do estilo pode se manifestar: assim sendo, identifica a questão das diferenças entre as culturas artísticas da Renascença e do Barroco, a partir dos respectivos valores que estas épocas assumem, em casos como os da arquitetura e da pintura; identifica nesta diferenciação, o problema da definição das forma autônomas e fechadas, que caracterizam o sistema da representação e da expressão clássicas, por oposição à complexa e agitada negociação entre as formas, característica do Barroco. Esta análise certamente não esgota o assunto, mas serve para mostrar de que forma os estilos são a expressão do seu tempo. Não há dúvida de que é um novo ideal de vida que nos fala através da arte do Barroco italiano, e apesar de termos colocado a arquitetura em primeiro lugar, por incorporar de forma mais evidente esse ideal, os pintores e os escultores contemporâneos nos dizem a mesma coisa em sua linguagem própria, e quem que pretenda reduzir os fundamentos psíquicos da mudança de estilos a princípios abstratos, provavelmente encontrará a palavra-chave entre esses últimos mais do que entre os arquitetos (pp. 11,12,13). O autor conclui esta primeira parte do texto, tentando justificar o lugar de uma interrogação conceitualmente justificada sobre o status do estilo na história da arte: ele reconhece, em primeiro lugar, que a perspectiva histórica da interrogação sobre o estilo parece falar de aspectos que são estranhos ao modo como a arte se manifesta, enquanto dado da cultura; entre uma abordagem do problema do estilo baseada no estudo sobre o temperamento (psicológico, geográfico e histórico) que gerou certas obras, e aquele tipo de aproximação que valoriza a qualidade expressional das obras, o autor propões um tipo de approach que se defina pelos modos de representação que encontramos associados a grupos de obras, tomado como objeto das interrogações sobre o que é recorrente e o que serve para delimitar diversos critérios para a assimilação das obras em diferentes grupos de estilo ou de época. Antes de mais nada, tudo isto implica na admissão de que as diferentes épocas em que um estilo se deixa expressar representam diferentes modos de toda uma cultura artística visualizar concretamente seus temas, materiais e modos de se dirigir artisticamente a esses mesmos motivos (a idéia de que a visa está inscrita à historicidade da experiência, enquanto um todo). O exemplo do autor é o da comparação entre dois pintores de um mesmo período, mas de estilos individuais completamente diversos, Bernini e Terborch: nos desenhos desses dois mestres, entretanto, o autor identifica um elemento que os aproxima, e que é precisamente da ordem de uma forma mais geral da representação, isto é, uma valorização das massas em detrimento da composição linear, que caracteriza o estilo da época anterior a estes dois. Em outras palavras, pode-se descobrir na história dos estilos um substrato mais profundo de conceitos que dizem respeito à representação como tal, e é possível vislumbrar-se uma história da evolução do modo de ver do Ocidente, para a qual a diversidade do caráter individual e nacional não é de importância decisiva. Sem dúvida, não é fácil desvendar essa evolução interna do modo de ver, pois as possibilidades de representação de uma época nunca se revelam em estado de pureza abstrata, aparecendo sempre, o que é natural, unidas a um certo conteúdo expressivo, e o observador é geralmente levado a procurar na expressão a explicação para a obra de arte como um todo (pp. 13,14,15,16). As formas mais gerais da representação: ao definir-se pelas formas abstratas da representação, como esse aspecto intermediário das obras, o autor procura estabelecer uma distância entre a análise por demais exteriorizada das condições internas nas quais se originou (visão própria aos historiadores), sem entretanto restringir o caráter expressional da obra ao poder da inspiração ou da psicologia artística (como é o caso da visão própria aos artistas sobre a gênese do estilo): deste modo, a análise das obras se detém no modo como elas são capazes de reter ou de exprimir um modo de percepção, próprios às épocas e aos lugares em que elas são feitas. Por outro lado, a proposição das formas elementares da representação se deixa assimilar por uma visão na qual as diferentes épocas são estruturadas em diferentes modos de percepção: daí porque o problema destas formas esteja assimilado a uma visão sobre a evolução histórica das formas da representação. A delimitação da arte ocidental com cindida entre um período clássico (cujo último avatar é o Renascimento, sobretudo o florentino) e um Barroco (assimilando muitas das tendências que culminarão na arte pré-moderna), é exemplificada pela oposição de determinados conceitos das formas da representação, e que se dispõem em cinco grandes grupos de noções, os seguintes: o linear e o pictórico, isto é, a evolução de uma arte baseada nas funções da linha e do contorno na visualização dos temas, e outra, baseada na função dos volumes e das tonalidades; o plano e a profundidade, que designa a separação entre um tradição para a qual os limites do plano estabelecem o lugar do motivo visual, e outra, na qual o plano se dissolve na profundidade, como desdobramento da valorização das relações entre os elementos formais da composição, e que é própria ao Barroco; a forma fechada e a forma aberta, delimitando um estilo no qual os limites do plano e a importância dos contornos fixam o problema da forma num grau de estabilidade considerável, ao passo que a tradição que deriva da importância atribuída às massas visuais e à profundidade redunda numa forma de representação em que impera a incompletude dos motivos representacionais; pluralidade e unidade, que exprimem uma resultante da oposição anterior, pela qual a arte clássica tende a manter as formas autônomas, no interior de um mesmo plano, ao passo que a arte do século XVII, a relação entre as formas gera um tipo de arte que se exprime no plano da unidade entre seus elementos constituintes; finalmente, as clarezas absoluta e relativa dos objetos, pelas quais se diferenciam os modos de apresentação dos objetos como distintos (e relativos ao tato) e integráveis uns aos outros (como no sentido da visão), o que restitui-nos à primeira das oposições, entre o linear e o pictórico (pp. 17,18,19,20). Imitação e Decoração: no tratamento das formas mais gerais da representação, o autor destaca dois níveis de sua significação, para o historiador, um ligado a seus aspectos imitativos (isto é, ao modo como estas formas realizam uma visão de mundo, própria às diferentes épocas) e outra, ligada aos esquemas de representação artística propriamente ditos, designando a primeira de significado imitativo das formas de representação e à segunda de significado decorativo das mesmas formas. Assim sendo, a oposição entre linear e pictórico, por exemplo, não atende apenas a fins de produção de simitude, no plano plástico e perceptivo, mas também a um idela de beleza próprio aos diferentes estilos de épocas. Assim sendo, a tarefa de um historiador da arte será a de avaliar o modo como se correlacionam, na mudança dos estilos que caracterizam certos períodos da arte européia, as dimensões de um modo de ver, próprio a cada um dos estilos históricos, assim como os modos de configuração desta visão em padrões representacionais característicos (pp. 20,21,22).

Referências Bibliográficas: não as há

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